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ANIMA DOLOR

São Paulo, 11 de Setembro de 2021

Sentimos dor. É da natureza humana. Acredito ser da natureza da maioria das espécies sentir dor. 

Algumas dores são físicas. Cortes, contusões, infecções, mal funcionamento de um ou mais órgãos, desordem na sincronia do organismo.  Todas dores físicas. Em sua grande maioria podem ser amenizadas por analgésicos. Santa descoberta humana. 

Antes da ciência nos valíamos apenas da analgesia das plantas, que nos forneceu nossas primeiros entorpecentes.  Acredito que nossos ancestrais já utilizavam dos poderes das plantas para amenizar suas dores e isso os ajudou a tornarem-se mais resistentes a dura vida que tinham. 

Muitas dessas alquimias geraram as drogas e o álcool. Amplamente utilizadas para fins medicinais e para fins alucinógenos. 

Ah, a alucinação! O poder de nos tirar de nossa realidade. Desligar de alguma forma nosso consciente para a dor. Dor física ou dor psíquica.  

As dores psíquicas são ainda piores que as físicas. Pois elas residem na consciência. Residem em algo impalpável. Não existe um órgão, externo ou interno, que seja o responsável direto.  Cientificamente, o cérebro faz essa função, junto aos bilhões de neurônios espalhados por todo corpo.  Mas também, cientificamente, as células de nosso corpo são trocadas frequentemente. Não somos quem éramos a pouco tempo atrás, mas permanecemos os mesmos.  

Então a dor psíquica está lá. Nos acompanha. Fere nosso ser de forma profunda, a ponto de brotar em dores físicas, dores palpáveis, detectáveis e amenizáveis.  

Mas a dor psíquica está lá. Permanece.

Infringimos dor em nós mesmos. Nos maltratamos com nossa covardia, com nossos medos, com nossa falta de coragem. Infligimos essa dor em nós mesmo a cada vez que falamos ou deixamos de falar ou agir de acordo como nossas verdades mais profundas. Quando fazemos isso para agradar, para se adaptar, para se ajustar, para se relacionar, para “manter a paz”. Que paz? Que paz interna pode ser conseguida evitando certas guerras, as guerras da sua própria verdade? Mas também infligimos essa dor aos outros. Dores aplicadas em pequenas doses, somadas diariamente. Dores que nunca passam.  

A dor física é lembrada, mas em sua grande maioria não é vivida em sua plenitude na lembrança. Fomos forjados biologicamente para lembrar que “doeu”, para que não cometamos o mesmo erro novamente, mas não para reviver a dor, para senti-la novamente.

A dor psíquica não é assim. Ela nos machuca dia a dia. A cada vez que é ativada na memória, ela dói. Dói em nossa alma, em nosso corpo, em todo nosso ser. E quando a mente não aguenta mais, ela grita. Grita no corpo até a doença física, ou grita na alma até a profunda depressão. Ou ambas.  

Aquele que nos fez sofrer, que infringiu a dor, pode passar sua vida sem nunca saber, sem nunca entender, sem nunca aceitar ou respeitar a dor que fez o outro sentir. Quando toma ciência dessa dor, quando entende e aceita a dor causada no outro, tornasse um peso terrível de ser suportado. Dê um soco, um tiro não mortal, tenha um acesso de fúria contra o outro. Você irá ferir a carne. Essa se cura. Essa sara. Mas como curar a alma? 

Só o tempo nos ensina a viver. E nos permite suportar. São feridas que talvez nunca sarem. Feridas que talvez só possam ser suportadas com a distância física e psicológica, com o relativo esquecimento trazido pela distância. Insuportável é a vida vivida ao lado de quem te traz dor e sofrimento, seja seu companheiro, seu familiar, seu colega de trabalho. Mesmo que esse seja o “lobo em pele de cordeiro”. De nada adianta todas as ações práticas advindas dos pedidos de desculpas que oferecemos aos outros se no olhar e nas palavras a dor permanecer sendo sentida por essa pessoa. 

As cicatrizes são inevitáveis na vida. Mas elas são só a superfície da dor. A parte que podemos ver. É lá dentro que a dor permanece viva. Viva todos os dias, todas as horas. Conviver com ela, aprender a domar, é o desafio diário. 

Que a ciência possa ajudar a nós, pobres humanos, a aprender a suportar e viver com essas dores. Pois elas não passarão, jamais. Certas coisas vieram para ficar.  

Foto por Sammy-Sander|Pixabay

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Emma Dee McCabe
Emma Dee McCabe

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